O último trimestre do ano representa, para muitas organizações, um momento decisivo. É o ponto fulcral em que diferentes equipas se reúnem para traçar estratégias, planeando em detalhe o ano seguinte. Neste sentido, a aposta em novos mercados representa tanto uma oportunidade de crescimento já na mente de muitos líderes, quanto um desafio que exige soluções robustas e especializadas no que toca à gestão de riscos.
No cenário económico atual, a expansão internacional das empresas é uma realidade cada vez mais imperativa para a sua sustentabilidade e crescimento – em Portugal, revela-se vital face à reduzida dimensão do mercado interno. A interdependência das geografias globais exige, mais do que nunca, uma gestão estratégica e assertiva deste tipo de operações.
O que pode significar a decisão de ir além-fronteiras? Para as empresas cuja atividade envolve o processo de importação e exportação, o seguro de mercadorias torna-se um elemento central na mitigação de riscos, especialmente face a novas regulamentações e às complexidades inerentes à circulação de bens.
Este tipo de solução cobre os danos ou avarias sofridas pela carga durante o transporte, por via marítima, aérea ou terrestre, bem como o transbordo e o armazenamento intermédio (desde que inerentes ao transporte). Um dos principais fatores a ter em conta neste contexto é a limitação da indispensável responsabilidade civil dos transportadores, cujo impacto pode ser significativo.
De acordo com as convenções internacionais, a responsabilidade do transportador está limitada aos danos causados por este, ou entidades por si contratadas, a terceiros, sejam estes consumidores finais ou intermédios, deixando de fora uma ampla gama de situações, como eventos naturais ou alijamento da carga, representando um risco para o proprietário da mercadoria. Paralelamente, esta limitação está também vigente ao nível do valor da indemnização, tendo métricas máximas definidas pelas respetivas convenções.
Neste sentido, a contratação de um seguro de transporte com cobertura alargada – em particular a Cláusula “A”, definida pelas “Institute Cargo Clauses”, conhecida por “All Risks” – assume-se essencial para a proteção das mercadorias durante todo o processo logístico. Contrariamente ao que acontece com as apólices de responsabilidade civil, em que a transferência de risco vai oscilando de operador para operador ao longo de toda a complexa cadeia logística, o seguro de mercadorias assegura uma permanente e contínua alienação de responsabilidade, conferindo segurança, previsibilidade e agilidade em todo o processo.
Tomemos como exemplo o caso do Reino Unido, um mercado repleto de desafios, mas igualmente pleno de oportunidades.
Com o Brexit, os riscos para os expedidores aumentaram consideravelmente, uma vez que a potencial aplicação de novas tarifas alfandegárias e a reconfiguração dos acordos comerciais tornaram o valor das mercadorias exportadas ainda mais suscetível a variações.
A responsabilidade não se limita ao valor da carga, mas abrange também os custos adicionais impostos pelas taxas aduaneiras, o que eleva o risco de perdas financeiras em caso de avaria ou extravio. Além disso, há responsabilidade para o agente transitário, mesmo que de forma solidária para com os seus subcontratados, dado o risco natural dos erros potenciais de incumbência de despacho aduaneiro.
Além das questões associadas à saída do Reino Unido da União Europeia, o conflito em curso na Ucrânia e as perturbações na cadeia global de abastecimento também se fazem sentir no transporte marítimo. As questões laborais, como as greves frequentes nos portos britânicos ao longo dos últimos anos – com a consequente redução das escalas nesses portos e o desvio de navios para locais alternativos – combinadas com o cumprimento das sanções internacionais e novas exigências aduaneiras criam um ambiente altamente volátil.
Há ainda o fator das alterações legais. O governo britânico anunciou recentemente novas medidas para combater a imigração clandestina, estabelecendo multas significativas para os transportadores que não assegurem a devida proteção dos seus veículos contra a entrada de migrantes a bordo. Sanções que vêm somar-se a um já complexo quadro de regulamentos e que podem estender-se a outros mercados, sublinhando a necessidade de um acompanhamento especializado e de uma cobertura de seguros que garanta a conformidade legal e a segurança operacional.
À medida que nos aproximamos do final do ano, é fundamental que as empresas avaliem proativamente as suas estratégias de gestão de risco, principalmente no que toca às operações em mercados estrangeiros. Com uma abordagem informada e o apoio de parceiros especializados, podem não só mitigar desafios, mas também capitalizar oportunidades emergentes, garantindo um crescimento sustentável e precavido contra as incertezas globais – porque na rota da internacionalização, a precaução terá sempre prioridade.
Um artigo de opinião de Luís São Vicente, Diretor de Negócio da UN Porto na F. REGO, publicado na Supply Chain Magazine.